Friday, November 28, 2008

Sombras


Sombras, vultos, fantasmas, cadáveres ambulantes… não, não é um filme de terror. Não é preciso ligar a televisão ou esperar pelo Halloween para ver este cenário. Basta sair durante a noite e andar pelas ruas observando os seus recantos mais escuros. Não são monstros, são pessoas. Embora alguns estejam mais mortos do que vivos, eles já foram como nós. Já tiveram uma família por pior que fosse, já tiveram uma casa por mais pequena que fosse, já tiveram roupa lavada e um prato de comida quente à hora de jantar. Já foram amados e já foram odiados. Agora são apenas desprezados. Ninguém nasce com uma rota traçada para a miséria e para a pobreza. Podemos nascer no meio da maior das misérias, mas há sempre uma maneira ou outra de nos libertarmos das suas amarras. Cada um é dono do seu próprio destino. Cada pessoa deita-se na cama que fez, mas também vivemos num mundo cão que nem sempre é justo e nem sempre reserva às pessoas aquilo que elas merecem. Nem toda a gente escolhe viver na miséria e nem toda a gente tem comportamentos que a ela levam. Muitos são vítimas do infortúnio, outros apenas pagam por terem cedido à tentação. Uma vez com os pés na merda, é difícil sair. Tal como o dinheiro gera dinheiro a pobreza atrai ainda mais pobreza. Qual será a sensação de saber que vamos viver na rua e viver da boa vontade das outras pessoas até ao fim das nossas vidas? Qual será a sensação de passarmos na rua e toda a gente se desviar de nós e nos ignorar? Como é viver sem família, sem amor, sem carinho? Qual o sabor da solidão, da derrota, da perda de vontade de viver? Ninguém que saber a resposta. Nem toda a gente consegue ver que no meio das sombras existe uma pessoa. Por mais surreal que pareça essa pessoa também sofre, também chora, também sente. O que sei eu sobre miséria? Quase nada. Sei apenas aquilo que vejo e sei que não gosto disso. É duro ver para além das sombras, mas só assim descemos com os pés à terra e vemos que a vida não é só brilho e glamour. Para quê tanta exorbitância e tanto desperdício de dinheiro e comida? Podemos nem ser muito ricos, mas termos cama, roupa e comida é um luxo para muitos. Não nos devíamos queixar tanto, pois somos demasiado bem tratados. É pena não nos apercebermos disso mais vezes.

Wednesday, September 24, 2008

Super- Heróis



Quando era pequenina não sonhava ser grande… Queria continuar pequena, mas com a liberdade dos adultos. Queria poder decidir, fazer, desfazer e dizer o que me apetecesse. Queria ser uma super mulher, uma heroína com poderes mágicos e um coração do tamanho do mundo. Sonhava que um dia alguém me revelaria que não era quem pensava ser e que tinha um poder incrível que salvaria o mundo de todos os males. Sonhava em vestir meu uniforme e me transformar numa guerreira que partia em luta pela justiça e pelo bem dos fracos e oprimidos. Os anos passaram e não surgiu nenhum super poder. O sonho foi-se desfazendo à medida que me via como uma pessoa mais normal. Agora olho para mim e apercebo-me que sonho em ser a criança que sonhava em ser super poderosa, mas não queria outra coisa além de estar protegida de todo o mundo através dos braços que a amava. Os anos passam e dei-me conta das minhas fraquezas e dos meus defeitos. Conheci-me cada vez melhor e agora percebo porque não fui uma super-mulher, ou aliás uma super-criança. Não teria tido estofo, e continuo sem o ter. Sou humana como toda a gente: choro, rio, grito, tenho medo, iludo-me e depois desiludo-me, adoeço, critico, desdenho, odeio, amo, cuido, ajudo... Tenho virtudes e tenho defeitos. Utilizo-os consoante o outro. Posso amar demais e odiar de morte. Posso ser destemida e avançar sempre em frente com a minha vida, mas antes de o fazer também tenho medo. Não sou de ferro, nem vou viver para sempre. Penso demais na vida e nas coisas para além dela, vejo as rugas a ficarem cada vez mais definidas e a paciência cada vez mais curta. Toda a gente tem de crescer, até mesmo os super-heróis crescem. A diferença é que eles não ficam doentes, não fraquejam, não param de lutar. Nós, meros humanos, coitadinhos… cada vez aguentamos menos à medida que crescemos. O problema é viver demasiado em tão pouco tempo. Chegamos a um ponto em que precisamos de um tempo para recarregar baterias para nos levantarmos, sacudir a poeira, tratar das feridas e continuar nossa caminhada. Eu posso já ter caído muitas vezes e posso vir a cair mais, mas levanto-me sempre e não deixo de viver por causa disso. Não super-heroína, sou muito fraca para isso. Mas as outras pessoas também não são super-heróis, eu pelo menos não conheço nenhum. Todos temos fraquezas, mas o que interessa é nelas encontrarmos força. Se erramos, pelo menos já ficamos a conhecer algo que não devemos fazer. Se ficamos doentes pelo menos sabemos que para a próxima devemos ter mais cuidado com a nossa saúde. Se falhamos, pelo menos podemos prometer que para a próxima nos esforçaremos mais. Podem nos acontecer muitas coisas más, mas através ficamos a conhecer outras coisas boas e aprendemos a dar valor às coisas pequenas que a vida tem. É observando o mal que aprendemos a praticar o bem, quer para os outros quer para nós mesmos. Quando o mal nos atinge não podemos ficar deitados muito tempo. Há parar, pensar, chorar, gritar, sarar e recuperar para ganharmos forças e nos levantarmos. Eu já estou prontíssima para continuar a caminhada. Aliás já a retomei há algum tempo. E se cair outra vez? Levanto-me novamente e sigo em frente. Nisso temos de ser fortes e é nestas alturas que se vê que em cada um de nós há um bocadinho de super-herói.

Thursday, July 24, 2008

Uma grande lição


Desde pequenos que nos ensinam padrões de comportamento, regras que devemos cumprir, noção do certo e do errado, a diferença entre o poder fazer e o dever fazer. Lembramo-nos de ouvir os nossos pais, os nossos avós, os nossos tios, os professores, a gastarem quantidades incríveis de saliva para nos explicar esses padrões, ou então para nos repreenderem. Em alguns casos lembramo-nos até de ver a usar um gesto, um olhar, um tom de voz mais elevado, para nos levarem à razão, ou seja, para que nos comportemos de forma correcta e cumpramos as nossas obrigações enquanto indivíduos-filhos-alunos-sobrinhos-netos, seja o que for. Será que depois de tanto trabalho o saldo foi positivo? Será que aprendemos a lição? E se as pessoas que nos educaram nos vissem agora, tal como somos, sem rodeios? Ficariam satisfeitas ou não? Alguns sim outros não. Cada indivíduo é diferente e cada criança é um caso especial. A par da educação, a genética, os traços de personalidade que temos desde o tempo em que estamos no útero da nossa mãe, também influenciam nesta lição. Se uma criança mais tarde não se revelar aquilo que os educandos pretendiam não quer dizer que a culpa seja totalmente deles. Há pessoas que já nascem com uma personalidade de tal maneira vincada que é muito difícil ir contra os seus princípios, e por personalidade forte e vincada não quer dizer necessariamente que seja uma personalidade adequada segundo os padrões de comportamento que nos impingem desde crianças. Se a lição não foi entendida é uma pena, pois esses padrões não existem para nos limitar e sim para nos dar liberdade, enquanto seres humanos para viver num mundo seguro e sem conflitos. O mundo perfeito não existe, pois nenhum humano consegue ser perfeito, mas não vejo mal algum em tentar lutar por isso. Agora para aqueles que aprenderam a lição é necessário ter cuidado com as crianças que estavam distraídas quando lhes diziam que a inveja era um sentimento feio e que não se deviam meter na vida das outras pessoas, nem prejudicar os outros. É claro que todos nós somos tentados a experimentar esses sentimentos e provavelmente já os utilizamos, mas também haverá alguns que já foram mais vítimas deles do que causadores, como me aconteceu a mim. Contudo, é bom sermos confrontados por essas “crianças que não aprenderam a lição”, porque isso só fortalece a ideia que temos de nós mesmos, e quão bem instruídos somos e como os nossos educandos se orgulhariam de nós. Costuma-se dizer quem vai à guerra dá e leva, neste caso eu diria, quem vai à guerra volta e deixa lá o inimigo sozinho com um novo brinquedo. É preciso dar espaço as essas crianças ou adultos imaturos para crescerem (se é que alguma vez irão crescer), pois para nós os tempos da escola já acabaram há muito. Agora está na altura de lidarmos com problemas a sério e pessoas a sério, pois quem vive em função dos outros não é uma pessoa a sério. Temos de aprender a ser nós próprios e a viver pelo que somos e pelo que fazemos. Intrigas, inveja e ciúme apenas levam à solidão. Se já aprendeu a lição, os meu parabéns, se ainda não aprendeu, tenha cuidado que um dia o feitiço vira-se contra o feiticeiro.

Thursday, May 15, 2008

Aprender a ser feliz



Os dias passam… e vão-se transformando em semanas, meses e anos. O tempo é mais rápido do que nós queremos, mas a ânsia de ver o próximo episódio da nossa vida é demasiado grande. Esquecemo-nos das coisas boas da vida, não nos lembramos de quem éramos e já não sabemos quem somos. As pessoas mudam sem se aperceberem. Mudam as atitudes, a forma de estar, os hábitos, mas no fundo a essência será sempre a mesma. A embalagem de um determinado produto pode mudar, mas o sabor desse produto é sempre o mesmo; e se, por ventura, decidem mudar o sabor do produto, este perde a sua essência e sabe-nos sempre a falso. Contudo, estamos sujeitos à mudança, por mais ligeira que seja. Podemos estar diferentes, mas a nostalgia do passado insiste em visitar-nos e tenta mostrar-nos como éramos mais felizes então. Terei saudades do meu passado? Tenho…mas não de tudo. Tenho saudades da idade, tenho saudades de algumas amizades, tenho saudades de dias e noites bem passadas em que parecia que me deixava levar pelo meu espírito. Não saudades do sofrimento, mas às vezes tenho saudades da angústia, pois parece que só assim os versos se desprendiam da minha mão para o papel. Tenho saudades da rima, das convicções, das lutas, da inconformidade, da facilidade de expressão. Por vezes penso que a nostalgia é a maior fonte de inspiração. Quando estamos triste somos mais expressivos. Quando não somos correspondidos temos mais facilidade em desabafar através do lápis. O que é certo é que a solidão, a dor, a angústia não moram mais em mim e no entanto escrevo. A rima apesar de adormecida continua a fluir no meu sangue. Sinto-a! Pois tudo o que olho para mim é poesia. Livrei-me da nuvem negra que tanto tempo pairou sobre mim. Estou a aprender a ser feliz, apesar de, às vezes, a nostalgia recair sobre mim. Pois que seria de mim sem a melancolia dos versos, das palavras, dos pensamentos. Não seria eu. Apesar da mudança, agora sinto que sou mais eu. No fundo não mudei, continuo a mesma sonhadora de sempre, só que agora já não sonho sozinha. Porque continuo com assaltos de nostalgia? Because I’m a happy person that sometimes loves to be sad.

Tuesday, January 15, 2008

Relembrar o esquecido


Esquecemo-nos das coisas… A nossa mente prega-nos partidas. Somos seres em constante mudança. Num dia choramos, no outro juramos nunca mais fazê-lo. Beijamos alguém e de repente cerramos nossos lábios para sempre. Esquecemo-nos do valor das coisas, dos sentimentos, daquilo que realmente importa. Esquecemo-nos de como se escreve, como se chora, como se ri, como se fala. Somos prematuros. Somos burros e somos sensíveis. Um pé passa por cima de nós e esmaga-nos! Ninguém consegue fazer com que os entendamos. Esquecemo-nos de quem somos… esquecemo-nos das noites frias de Janeiro salgadas pelas lágrimas do choro; da falta que sentimos daquele abraço, daqueles carinhos; das desilusões e da falta de esperança; dos momentos de lucidez; das saudades; dos sorrisos que pouco a pouco nos foram devolvendo à vida; das mãos que se uniram para nos erguer de novo para a existência; das noites passadas na rua dos maltratados; das aventuras; das desventuras; das alegrias; das tristezas; de momentos e pessoas únicas que fizeram com que tanta emoção valesse a pena ser relembrada. Um ano passou e a ferida sarou, a mágoa passou. E tudo aquilo que era não mudou, apenas seguiu um rumo diferente. Porque eu não me esqueço de tudo, apenas me esqueço do nada que outrora me povoava. A rua dos maltratados já não é a mesma, as noites passadas ao relento já não são diferentes, tudo seguiu um rumo diferente, mas há coisas e pessoas que nunca mudam e que embora sigam rumos diferentes continuam a deslumbrar-nos. Passado um ano continuo a escrever as minhas melancolias e o velho continua galante e fascinante a recitar Bocage, mas já não está à espera do ópio. As coisas esquecem-se, mas de um momento para o outro somos invadidos por flashbacks que nos devolvem a essência outrora perdida no dilúvio que é o nosso pensamento.

Impossível esquecer o velho galante, o Sr. Gusto que conheci na rua dos Maltratados.